Um monte de caracteres. Pra dar preguiça de ler.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Vida plana

O "eu virtual" se faz cada vez mais presente num mundo onde cada vez trabalhamos mais e realizamos mais atividades. Sem a mesma dedicação de outrora, afinal, frequentemente são atividades paralelas e simultâneas. A possibilidade de anular distâncias criou uma renovação no conceito de "comunidade", que anteriormente continha certo valor geográfico. Atualmente, "comunidade" se refere a um grupo com algum interesse em comum. Mesmo que seus membros se encontrem cada um num país diferente ou apresentem outras diferenças brutais. A proximidade não precisa mais ser física. É suficiente se acontecer em âmbito virtual.

"Não sou eu. É um holograma."

A popularização de páginas pessoais, blogs, fotologs, perfis e mais uma infinidade de possibilidades de posicionamento em rede tem mudado profundamente as relações sociais. Se há 20 anos atrás era preciso telefonar e manter um diálogo que exigia a atenção para conversar com alguém, hoje é possível conversar virtualmente em tempo real. A diferença é que não é tão instantâneo assim. A emissão da mensagem é instantânea. Porém, a recepção dessa mensagem depende da vontade do receptor. Uma janela do msn piscando ou um scrap no Orkut ilustram bem essa idéia. Posso continuar escrevendo aqui ou clicar na janela para visualizar o que me foi dito. Posso entrar no Orkut para saber se me deixaram algum scrap ou esperar mais algumas horas. O universo virtual oferece autonomia no processo de emissão e recepção de mensagens. A mensagem é emitida no momento que for conveniente ao emissor, independente da disponibilidade do receptor. E, por sua vez, o receptor escolhe o momento que considera mais apropriado para se dedicar à recepção das mensagens.

Páginas de perfil podem ser acessadas a qualquer momento, independentemente do dono do perfil estar conectado ou não. O usuário de um perfil online constrói uma descrição pessoal através desse espaço virtual e, com isso, cria a ilusão de que está constantemente acessível, já que é possível ter contato com a sua individualidade e dirigir-lhe a palavra em qualquer momento, de qualquer ponto ligado à rede.

"Só dá valor quando perde."

A ilusão de que as pessoas estão constantemente acessíveis cria uma certa sensação de conformismo e descaso quanto à manutenção de vínculos afetivos. A garantia da disponibilidade, mesmo que virtual, provoca uma desvalorização das relações presenciais. Com isso, grande parte das relações interpessoais acontece em ambientes virtuais, intercaladas por gaps variáveis e de forma consideravelmente superficial, já que o usuário da rede nunca se dedica a uma atividade só e divide sua atenção entre diversas atividades paralelas, minimizando a atenção direcionada a cada uma delas e, consequentemente, a absorção completa dessas experiências.

"A intimidade é uma merda."

A possibilidade de encontrar uma pessoa virtualmente a qualquer momento permite a procrastinação desse momento. A expressão da língua inglesa "take for granted" define perfeitamente a relação que se estabelece entre pessoas virtualmente acessíveis. É a mesma relação que se estabelece, por exemplo, nas relações entre familiares ou pessoas com avançado nível de intimidade. A preocupação em alimentar e otimizar as relações próximas desaparece completamente, dando lugar a um menosprezo inconsequente que reduz consideravelmente o feedback oferecido nas relações interpessoais de base. Outra característica desse descuido é a frieza com a qual as relações mais íntimas são tratadas nos ambientes virtuais. O contato através de uma tela luminosa é usado como alternativa ao contato sensorial. Imagens bidimensionais, textos e (com menor frequência) elementos audiovisuais substituem os estímulos sensoriais tridimensionais do contato visual direto, da audição direta (sem efeitos ou compressão), do tato, do olfato e (por que não?) do paladar. A experiência real é estruturalmente mais completa que a virtual, pois exige mais da percepção humana, característica que intensifica sua solidez enquanto experiência de vida.

"Ser humano, um ser social"

Não há como negar que o ser humano é um ser social e precisa estar inserido numa sociedade para se sentir coerente enquanto animal. A necessidade de se relacionar com outros seres humanos é facilmente provada ao analisar casos de sofrimento causado por solidão, sofrimentos causados pela perda de pessoas queridas e sofrimento causado pelo esvaziamento resultante de determinadas privações sociais. O ser humano precisa biologicamente do contato físico. E precisa psicologicamente do contato social. O contato virtual é o maior empecilho para a realização de um contato físico casual. E a ausência física de pessoas também pode provocar uma reação de abstinência social subconsciente.

"Cada um no seu quadrado"

O resultado dessa "nova ordem virtual" é o isolamento de pessoas em frente às telas de computadores, onde realizam uma enorme variedade de atividades e podem chegar a casos extremos de dedicação exclusiva à vida virtual. A divulgação da própria vida na rede permite que qualquer pessoa interessada na vida de alguém tenha acesso a essas informações sem que se faça necessário que a pessoa em questão se prive de suas atividades a ponto de propagar seu cotidiano entre os interessados. Com a possibilidade de contar a história apenas uma vez para o máximo de pessoas possível e poupar o tempo de deslocamento aos encontros "ao vivo" que deixam de acontecer, o homem virtual pode realizar uma quantidade maior de atividades, manter uma quantidade maior de vínculos afetivos (superficiais, até porque acontecem através da superfíe de um monitor) e, assim, acreditar-se (virtualmente) realizado. Porém, ao deixar o contexto real em segundo plano, também esquecemos que o nosso corpo pertence ao mundo real e que é esse mundo real o responsável pela manutenção da nossa vida biológica. Sem vida biológica, a produção intelectual, que é tão facilmente disponibilizada em âmbito virtual, deixa de acontecer. A existência em registro pode ser extremamente satisfatória quando não se considera a efemeridade da vida real. Apesar de ideologicamente válida, a eternidade virtual não é capaz de imortalizar a nossa capacidade de produzir e sentir. Sem consciência, não há vida. Pelo menos para a gente. E, na posição de espectadores da nossa vida, é o nosso olhar que determina se existimos ou não. Nossas realizações e tudo que deixamos pra trás são apenas produtos da nossa existência. E é isso que oferecemos ao mundo: produtos. Nada mais compatível com a realidade capitalista do que priorizar o produto em vez da presença. Afinal, o consumo de um produto é definitivo, oferece a relação de posse que nenhuma relação presencial poderia oferecer. E, como a escassez de relações reais provoca uma carência excessiva, a sensação de que a posse é mais satisfatória do que a construção imprevisível funciona como o principal combustível do sistema capitalista.

Os Jetsons

A rápida evolução tecnológica tende a tornar os ambientes virtuais cada vez mais acessíveis e amplos. Com isso, o universo virtual fica cada vez mais irresistível. A exposição pessoal no ambiente virtual supre a necessidade individual de expor a própria vida como forma de concretizá-la, de torna-lá real. Afinal, se ninguém viu, não aconteceu. Em contrapartida, a acessibilidade às exposições individuais de outras pessoas também supre a necessidade de absorção de experiências alheias. No fundo, ainda se trata de uma relação de troca. Porém, não acontece mais de forma direta. A troca é indireta e depende da iniciativa dos envolvidos no processo. Podemos considerar que há um certo "socialismo" de exposições pessoais. Todos podem se fazer acessíveis a todos. É como se todos pudessem ser de todos. Isso só não se concretiza absolutamente porque muitas pessoas optam por não se expor. Porém, temo que essa evolução seja um caminho sem volta, já que a sociedade se molda às próprias alterações essenciais. Se existe a possibilidade de se dedicar, mesmo que virtualmente, a mais tarefas, pode-se evoluir para uma cultura na qual esse comportamento seja massificado e até mesmo cobrado. O resultado disso seria a intensificação de relações estritamente virtuais. Temo que o mundo real se torne apenas uma extensão do mundo virtual, com finalidade meramente de preservação da espécie. Pode ser muita inocência da minha parte, mas acredito que não é possível se realizar através do consumo e que a única forma de realização efetiva acontece através das relações afetivas e das cumplicidades profundas. O monitor de um computador é um instrumento que nos permite acesso, inegavelmente, a uma amplitude de informações que nunca teríamos acesso numa vida inteira. Porém, não podemos esquecer que um objeto com tais proporções nunca será capaz de substituir todas e quaisquer experiências que o mundo pode oferecer. Existe muita coisa atrás do monitor. E dos lados também. Assim como atrás, em cima e embaixo.

Insight cibernético

domingo, 14 de setembro de 2008

Ecos Falsos visitam o Rio

Sábado passado, saí do show do Hives (Orloff Five - Via Funchal) aliviada por ter tido a oportunidade de ver novamente um show que prendesse a minha atenção do começo ao fim. Na minha humilde opinião (um tanto prepotente, por sinal), uma experiência desse tipo só vale a pena quando o espetáculo te pega por completo, você perde a consciência de si por alguns momentos e se entrega totalmente à experiência oferecida. Por uns tempos, cheguei a achar que isso era coisa de criança e que a idade me impedia de viver essa entrega. Talvez eu tenha mesmo criado calos e tenha me tornado mais exigente. Mas aconteceu de novo.

A recente redescoberta pelos prazeres da música acabou me levando ao Cine Lapa ontem. A atração da noite era o Ecos Falsos, banda de São Paulo. Já tinha alguns MP3's deles aqui no PC e isso era suficiente para dar moral pros caras, pois eu não cheguei a deletar os arquivos. Logo de cara, já percebi que os meninos se vestem direitinho. Têm aquela preocupação em construir um visual casual. Começa o show. O som da casa ajuda - quando os graves não soam excessivos. A partir daí, é rock 'n roll agitado, bem feito e divertido. Os timbres são agradáveis: agudos explorados pelas guitarras e pelos pratos da bateria. E o baixão segurando a onda. Além da boa música, o carisma segura a banda nos momentos de intervalo pra trocar de instrumento ou pra dar aquela afinadinha na guitarra. Intervalos, aliás, frequentes. Os caras sassaricam pelo palco ao longo do show, trocando de posições e instrumentos. A comissão de frente (leia-se: a galera das cordas) alterna os vocais e, com isso, todos acabam conversando com o público. Piadinhas inteligentes ou infames e discurso firme e bem construído. Provavelmente trata-se de mais uma banda de comunicadores sociais. Essa suposição ganhou forças quando o público foi convidado a se aproximar do palco para pegar brindes gratuitos - sob um humor sutil e simpático. Hipnotizada pela persuasão (usar a palavra "brinde" e "grátis" na mesma frase é capaz de provocar reação até dos mais durões), fui buscar meus brindes na beira do palco: um adesivo e um... santinho?!?!?! E começaram a tocar " O bom amigo Inibié". Na parte de trás do folheto, onde deveria haver uma oração, a letra da música. Genial! De uma forma geral, o show foi recheado por músicas divertidas e bem executadas, por músicos bem entrosados e com uma boa postura de palco, e tiradinhas de bom gosto. Deu até pra sentir a felicidade do baterista brincando com a bateria eletrônica (que, segundo eles, era novidade). Os pontos altos da noite foram: "A revolta da musa", a cover do We Are Scientists e "Reveillon". Aprovadíssimos!

Resenha de fã

sábado, 13 de setembro de 2008

Os limites da webradio

A tecnologia vem se fazendo cada vez mais presente no cotidiano das pessoas. As facilidades proporcionadas pelas novidades tecnológicas são tantas, que garantem a aceitação massiva dessas novas tecnologias. Com isso, a sociedade passa por mudanças profundas, num momento que pode ser considerado a “Era da Conexão”. Estamos no início de uma era que promete ser caracterizada pela interconexão generalizada. Tudo e todos estarão cada vez mais conectados à rede. A Internet veio para modificar completamente as nossas formas de interagir com o mundo e com as pessoas. É preciso existir na Internet para existir pro mundo. E foi essa constatação que levou milhares de empresas a construírem suas páginas na rede.

Os veículos de comunicação trataram de providenciar páginas que pudessem dialogar com seu suporte midiático original. Porém, já podemos afirmar que a vida vai se transferir para os ambientes da rede em todos os aspectos. A rede se tornará onipresente e sua existência será esquecida pela sociedade, que usufruirá naturalmente das vantagens oferecidas por esse novo sistema. O maior impacto causará mudanças nas relações humanas, o aperfeiçoamento do trabalho e a redução de tempo e custos. As páginas dos veículos de comunicação, que anteriormente ofereciam uma espécie de bônus ao suporte original, agora tendem a valorizar mais a rede enquanto suporte. Com isso, surgiu a produção de conteúdo exclusiva para os ambientes da Internet. Podemos encontrar vídeos, áudios e textos, assim como também podemos publicá-los na rede, sem grandes dificuldades burocráticas. O computador se tornou o eixo central das atividades humanas. Por isso é extremamente conveniente se fazer acessível ao computador. E foi nessa conjuntura que surgiram as webradios, assim como diversas outras possibilidades de entretenimento e informação on-line: TV, jornais, jogos, etc.

A rádio na Internet oferece maior possibilidade de segmentação, que atende às exigências do mercado publicitário, pois é possível transmitir várias programações diferentes simultaneamente. Enquanto a radiodifusão brasileira é controlada basicamente por igrejas, políticos e grandes empresários, que conquistam suas concessões através da influência, a webradio acontece livremente, não exige concessão e é relativamente fácil de ser criada por qualquer um.

No caso do jornalismo, a Internet oferece vantagens e desvantagens. Apesar de democrática e de disponibilizar uma ampla gama de conteúdos, já que qualquer um pode divulgar qualquer conteúdo na rede, não há a menor garantia de que haverá retorno, de que o material será acessado. Todo mundo pode publicar, mas nem tudo será lido. Essa amplitude de conteúdos diversos representa uma desvantagem, pois existem milhares de conteúdos disponíveis e não há como determinar quais são os mais adequados ao leitor, nem a veracidade dos seus conteúdos. Esse fim da hierarquização, assim como a saturação de informação, provoca uma queda na credibilidade.

A relação emissor-receptor é essencialmente diferente entre rádios hertzianas e webradios. A relação emissor-receptor mediada por uma rádio hertziana é passiva, na medida em que o fluxo de comunicação segue de forma unidirecional. No caso da webradio, o receptor também atua na interação, provocando uma troca de conhecimentos entre os grupos envolvidos.

Apesar de representar um ambiente livre e democrático, a Internet ainda é um espaço freqüentado diariamente por pessoas com maiores níveis educacional e de renda (fato que determina um público qualitativo). O Brasil possui atualmente cerca de 20 milhões de internautas. O crescimento da quantidade de usuários é cada vez maior e mais rápido, mas ainda há um longo caminho a percorrer, visto que cerca de 65% da população nunca acessou a Internet e apenas cerca de 15% dos domicílios têm acesso à rede.

"A presença da web na vida da sociedade brasileira tem provocado intensos debates e questionamentos acerca da mudança de padrões, da inversão de valores e até da própria sobrevivência de instituições milenares como a família, a amizade ou o casamento. Aos poucos, a internet vai mudando hábitos antes arraigados no cotidiano da população, como na forma de ouvir rádio, fazer amigos, bater papo, namorar, estudar e consultar bibliotecas, já que tudo isso agora se faz navegando pela rede." (PRATA, 2008)

Também vale ressaltar que a Internet está conquistando o público da TV. A migração para a Internet como principal atividade de lazer tem sido cada vez mais intensa. Essa transição rápida preocupa alguns governos e entidades, já que a web é uma área totalmente livre. Isso provoca intensos debates sobre a legitimidade da censura na Internet, que é fortemente defendida por uns e rejeitada por outros.

A usabilidade é um ponto fundamental no que diz respeito à aparência da página onde a webradio (ou qualquer outra homepage) está hospedada. A página deve ser prática, intuitiva, confortável e bonita para deixar o usuário confortável ao acessá-la. Existem estudos aprofundados sobre a questão da usabilidade e eles devem ser levados em consideração ao elaborar uma homepage. O usuário precisa se sentir confortável ao acessar uma página para se manter navegando por ela e repetir o acesso posteriormente.

O rádio sempre foi um veículo de fácil acessibilidade, pois exige apenas a audição do receptor. No caso da webradio, o conteúdo auditivo pode ser complementado por imagens, textos, ou vídeos, que representam elementos adicionais, mas não interferem no sentido da experiência auditiva, que é a essência do rádio. Embora haja uma ampliação das possibilidades de recursos, o rádio precisa acontecer, enquanto experiência completa e coerente, através apenas do sentido da audição.

Enquanto o rádio comum acontece através da transmissão hertziana, orientada através de concessões cedidas pelo governo, a webradio possui suas próprias características. São elas:
1. existência exclusivamente na Internet;
2. linguagem oral, cada vez mais complementada por elementos multimídia;
3. suporte fixo, característica momentânea, pois já estão sendo fabricados receptores de webradios, ligados à Internet;
4. baixo custo para sua existência e em pouco tempo seu acesso será de baixo custo também, com a massificação de receptores ligados à Internet;
5. transmissão em tempo real, de programações simultâneas alternáveis;
6. possibilidade de acesso às transmissões anteriores;
7. apelo sensorial estritamente auditivo;
8. autonomia, que permite a experiência individual da audição e permite que o emissor fale com o público como se tivesse falando em particular.

Ainda em fase de transição, já podemos esboçar os principais pressupostos desse novo modelo de radiodifusão: transmissão digital (através de bits, em vez de ondas), interatividade constante (o usuário é ativo: produz, procura e consome), menor fidelidade do público (resultado da multiplicação de opções e da segmentação) e possibilidade do uso ou transmissão de imagens e texto.

Apesar do próprio modelo não favorecer a massificação de uma determinada webradio, a própria tecnologia ainda não permite isso, pois a quantidade de ouvintes simultâneos ainda é limitada pelo servidor. O fator multimídia oferece recursos extras, como a imagem ilustrativa de uma determinada notícia narrada, ou as informações sobre a faixa musical executada, entre as mais variadas possibilidades.

Porém, existe o risco da vasta gama de possibilidades saturar a transmissão, que deve ser essencialmente radiofônica. E esta condição seria desfavorável à webradio, que poderia ser deixada em segundo plano no meio de diversos recursos a ela associados.

Na questão conceitual, as mudanças são tão profundas que geram dúvidas quanto à legitimidade do modelo radiofônico. Questiona-se se as novas tecnologias podem ser enquadradas enquanto radiofonia ou se constituem uma nova mídia ainda sem definição. As tendências convergentes são evidentes e estamos nitidamente caminhando para a era do tele-tudo (equipamentos definidos por André Lemos como tecnologias que vão unir telefone, TV, rádio, câmera, Internet, entre outros recursos). Porém, ainda podemos determinar limites pro que é considerado radiofonia.

"Meio de comunicação que transmite informação sonora, invisível, em tempo real. A informação sonora poderá vir acompanhada de textos e imagens, mas estes não serão necessários para a compreensão da transmissão." (PRATA, 2008)

Essa definição exclui os Podcasts, os iPods e qualquer transmissão que não seja feita em tempo real. Portanto, podemos concluir que a webradio é a comunicação que se concretiza através do áudio (podendo contar com recursos extras), produzida através da tecnologia digital, transmitida em tempo real por meio da Internet. Essa nova tecnologia reflete a migração das atividades humanas e sociais para os ambientes da Internet, provocadas por diversas vantagens e facilidades oferecidas pela rede. A tendência geral é de convergência de mídias e expansão da Internet para todos os setores da vida humana, de forma que ela se integre de tal maneira ao cotidiano que não possa mais ser dissociada e se torne um recurso natural e comum. A webradio, resultado da fusão do rádio com a Internet, é um dos primeiros passos que marcam essa fase de transição. Não há como prever as conseqüências de todas essas mudanças, mas podemos afirmar que a humanidade nunca mais será a mesma.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

KUHN, Fernando. O rádio na Internet: rumo à quarta mídia. Campinas-SP: Dissertação de mestrado da Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes, 2000.

LEMOS, André. Cidade-ciborgue. A cidade na cibercultura.

LEMOS, André. Cibercultura e mobilidade: a era da conexão. In: RAZÓN Y PALABRA. Out/Nov 2004.

PRATA, Nair. Webradio: novos gêneros, novas formas de interação. Belo Horizonte: Tese de Doutorado da Faculdade de Letras da UFMG, 2008.

Artigo elaborado para pesquisa coletiva sobre webradio

Bytes

O grito virtual percorre a rede e reflete em superfícies de dígitos binários. Essas cavernas onipresentes são caracterizadas por aquele silêncio absoluto, típico das multidões virtuais. O grito ecoa e produz sua própria resposta. Assim como uma imagem refletida entre espelhos posicionados em angulação aguda. Resposta silenciosa para um grito calado pela frieza de um monitor brilhante, que exibe a interface da rede social do momento. Essas redes sociais massivas são as típicas responsáveis pelo silêncio absoluto, que acaba soando mais intenso que uma torcida organizada no Maracanã. A presença de quaisquer pessoas ao redor desses espelhos em angulação aguda não interfere em nada na singularidade da figura refletida incessantemente. A onipresença desse silêncio ameaçador se estende ao infinito, ao oito deitado, às reticências. E aqueles que são falantes da língua portuguesa acreditam que tudo isso pode ser sintetizado em apenas oito letras. As multidões virtuais adotaram a rede para se conectar ao infinito. Um infinito que é construído a partir de zeros e uns. Conjunto vazio, conjunto unitário. É a configuração física da vida social do usuário, limitada a duas opções: vazio ou solidão. E à combinação de vazios e solidões aleatórios e sequenciais. Mas a ilusão é maior que tudo. E o volume de zeros e uns é suficiente para convencer de que há alguma solidez nessas superfícies. Mas os pés não encontram firmeza. A insegurança produz um grito tão virtual quanto todo o resto. O grito volta, que nem e-mail que não pôde ser entregue aos destinatários. Ninguém ouve e, se ninguém nota, então não existe. Não é listado no Google, nem no YouTube. E o tombo é daqueles, do tipo que só pode ser apreciado com várias voltas de scroll. Mas, como são várias unidades caindo simultaneamente pela imensidão do vazio infinito, o referencial adotado por qualquer unidade sempre oferecerá a impressão de inércia, com a qual as unidades se satisfazem. É confortável fazer parte dessa multidão virtual e a insegurança acaba sendo esquecida nos momentos de maiores taxas de serotonina, provocadas pela sensação vazia de inserção. No final das contas, todos acabam se contentando em ter o privilégio de ocupar um lugar nesse espaço virtual. E o eco surdo-mudo se perde em meio ao desconforto produzido pelo deslocamento negativo de uma faísca de consciência crítica autêntica ao longo da massa de pensamento fantoche pré-programado. A tecnologia criou uma sociedade incapaz de formar pares, incapaz de dialogar. Não me prepararam pra essa tecnologia toda. Pra mim, entre zero e um, tanto faz. Não faz o menor sentido. Não sou um computador.

Desabafo visceral

terça-feira, 26 de agosto de 2008

A construção da identidade através do Orkut¹

No contexto atual brasileiro, a construção da identidade tem encontrado um ambiente favorável na Internet, em sites de relacionamento como o Orkut. A participação em comunidades e a especificação de perfis constroem identidades virtuais desterritorializadas e incompatíveis com a amplitude de possibilidades para o comportamento humano. Frequentemente, as identidades criadas para os ambientes virtuais são projeções idealizadas e incompatíveis com as impressões causadas nos ambientes reais. Essa possibilidade de adaptar a própria imagem transforma os perfis virtuais em eficientes ferramentas de autopromoção. Paralelamente a isso, as pessoas passam a escolher os pontos pelos quais querem ser identificadas, em vez de deixar que os outros julguem sua personalidade através do convívio. Com isso, a popularidade está ao alcance de todos. Qualquer um pode adaptar seu perfil do Orkut de forma que atraia mais visibilidade e aumente o interesse pela própria página. Nos ambientes virtuais, cada página é um produto e são as melhores estratégias de marketing que aumentam a popularidade virtual dessas páginas. Popularidade essa que nem sempre se repete fora dos ambientes virtuais. Essa mudança nas relações sociais é significativa, já que atualmente é mais importante o que se diz fazer, o que se diz gostar e o que se diz ter do que o que realmente se faz, se gosta e se tem, de fato. O discurso ganhou forte importância persuasiva nas relações pessoais virtuais. Com isso, a identidade passou a ser tratada como produto. O nome passou a ser a marca pessoal. E o perfil, que supostamente deveria ser a expressão da individualidade de uma pessoa, passou a ser a expressão do que se quer ser associado a. As semelhanças são mais valorizadas que as diferenças. E, assim, nessa busca por popularidade, a página de perfil do Orkut se transformou em veículo de comunicação social.


(1) Resumo do meu projeto de pesquisa. Se quiser ler inteiro, ask me. x)

domingo, 18 de maio de 2008

A tara

Era um daqueles caras comuns, que parecem meros figurantes da nossa vida. Ele tinha a vidinha dele, os amigos de infância, aquela coisa limitada e familiar. E ele até gostava disso tudo. Porém, por trás daquele visual neutro, ele fantasiava com mulheres alternativas, com piercings e, principalmente, tatuagens. Era uma tara que começou ao ver uma punk no metrô e se estendeu ao material pornográfico que ele buscava na internet.

A vida dele mudou quando descobriu o Suicide Girls. Virou assinante e dedicava boas horas do dia à masturbação atlética. Era seu único vício na vida. Mas que vício!

Com o tempo, foi se afastando da família, dos amigos e de tudo. Seu rendimento profissional caiu e o pensamento era fixo: tatuadas. Mas ele não sabia onde encontrar essas mulheres tão perfeitas. Como falei, ele não vivia o meio alternativo. Não frequentava o monopólio da Casa da Matriz. Não usava óculos de aro grosso, nem as roupas da moda. Na verdade, nem sabia que isso era pré-requisito para entrar nesse mundinho. Até porque ele não sabia que esse mundinho existia.

Certo dia, resolveu se tatuar. Ficou com tanto medo, que optou por um tribal pequeno, escondido no ombro. Nenhuma mulher pisou no estúdio enquanto ele se tatuava. Isso só aumentou a frustração. Ele esperava encontrar uma mulher durante o processo. E não funcionou.

Mas não foi em vão. Ele foi convidado pelo tatuador para um evento de moda alternativa. E compareceu, óbvio. Foi a primeira vez que ele se viu num ambiente cheio de mulheres tatuadas. O nervosismo tomou conta e ele não conseguiu interagir com ninguém. Só com uma menina, logo na entrada, que torceu o nariz quando ele não quis mostrar a tattoo por vergonha. É, ele tinha vergonha de mostrar os ombros.

Fracassado, resolveu optar por outro recurso. A feira serviu para que ele descobrisse que as tatuadas eram adeptas do Orkut e Fotolog. E tratou de criar suas contas nos dois sites. Ah, e uma conta de msn!

Como todo novato, optou por se esconder atrás de fotos do que ele idealizava ser. E isso atraiu várias tatuadas. Em poucas semanas, já estava apaixonado por uma garota que tinha várias tatuagens e dizia ter 19 anos. Marcaram um encontro.

Encontraram pessoas diferentes do esperado. Ele não era aquele "Alexandre Frota" da foto. Ela também não era aquela "Suicide Girl" e certamente era menor de idade. Mas ele decidiu investir mesmo assim. Só porque confirmou que realmente existiam tatuagens no corpo da menina - apesar da camiseta dela ter mostrado apenas meio milímetro.

O namoro se estendeu por meses e nada de sexo. Na verdade, descobriu que ela era uma virgem de 15 anos. Ele, apaixonado pelas tatuagens que ainda não tinha visto, insistiu no relacionamento e decidiu esperar pela menina. Só a idéia de descobrir as tatuagens dela já era suficiente para garantir sua felicidade.

Meses depois, aconteceu. Ele levou a menina para um motel - tosco, até - e tirou sua camiseta. Foi quando ele deu de cara com o Huguinho, o Zezinho e o Luisinho, espalhados pelo corpo da menina. Ele ficou todo arrepiado. Broxou, claro. O amor acabou na mesma hora. Apesar da vontade de fugir, ficou abraçado e deixou a menina em casa. Mas nada de sexo.

E sumiu. Mesmo.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Recursos Hipócritas (RH)

Processo seletivo para vagas de emprego - 2008
Redação - Tema livre - 20/25 linhas

Título: Para confundir o avaliador

A redação faz cada vez mais parte da vida das pessoas. Está presente na vida escolar, no vestibular e até mesmo nos processos seletivos profissionais. Tem sido utilizada como a forma mais simples de avaliar como uma pessoa articula suas idéias e seu domínio da língua materna.

É notável o aumento da procura por cursos de Redação e Boa Escrita, onde os interessados em desenvolver tais habilidades são submetidos a centenas de regras, teorias, modelos e afins. "A prática leva à perfeição". E o novo "bom redator", certificado, passa a desfrutar de seu novo talento, escrevendo uma série de textos ensaiados, decorados, parecidos, previsíveis, recheados de expressões que aparecem em todos os seus textos. E a subjetividade, a sinceridade e, muitas vezes, até o objetivo legítimo de tal processo se perdem.

É lógico que existem os casos exemplares, com bons redatores, criatividade e qualidade de conteúdo. Sempre há alguma exceção. O bom redator é aquele que encontra os melhores recursos verbais para transmitir uma determinada mensagem, da forma mais agradável possível, dentro das limitações da linearidade característica da escrita. O bom redator é um grande orador, com bons argumentos. O bom redator é aquele que faz com que você esqueça, por alguns minutos, que ele é - pasme! - uma pessoa.

Avaliação: Candidato eliminado

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Os filhos

Mariluce, filha única, sempre foi fascinada por famílias. Principalmente depois que sua mãe morreu quando ela tinha apenas 9 anos. Ela não lembrava mais a causa da morte, mas tinha vergonha de perguntar e demonstrar que fora capaz de esquecer de um detalhe tão essencial para a sua própria história.

Para compensar a perda, seu pai estimulava que a menina criasse vínculos afetivos com animais. Cachorros, gatos, peixinhos, coelhos, passarinhos, ratinhos, pintinhos... A menina se encantava com os filhotes. Mas enjoava quando os bichinhos cresciam. E logo era presenteada com um novo filhote.

Quando Mariluce ficou mocinha, lá pros seus 12 anos de idade, seu pai ficou sem saber como agir. Queria que a menina entendesse o funcionamento das coisas, mas era incapaz de ser o mediador de tal aprendizado. Foi adiando, adiando... E Mariluce apareceu de mãos dadas com um menino.

- É seu namoradinho?
- Não, papai. É meu filho.

O tal filho, era um molequinho barrigudinho e fedorendo, como todas as crianças da idade dele. Mariluce realmente aparentava ser mais velha, mas é porque meninas crescem antes dos meninos no comecinho da puberdade.

Tal incidente intrigou o pai. Depois de alguns dias refletindo, decidiu botar a menina pra assistir documentários de Biologia. E saía da sala. Foi assim que Mariluce entendeu as coisas. E quanto mais os hormônios avançavam em seu organismo, maior era o espírito materno. Era um desejo cada vez mais incontrolável, inexplicável, de ser mãe.

Aos 14 anos, decidiu pôr em prática o ritual de fabricação de bebê. Não se preocupou com as consequências, nem com a bronca do pai, nem com nada. Só queria engravidar e ser mãe. Convocou um menino de 11 anos, punheteiro, para assumir o papel de pai. Marcaram para antes do horário da aula, quando não havia ainda ninguém no colégio.

Mas a tentativa fracassou. O menino se lambuzou todo antes mesmo de começarem qualquer coisa. Mariluce concluiu que era por isso que os pais eram sempre mais velhos do que as mães. E resolveu pensar num novo plano.

Fez 15 anos e ganhou um baile de debutante todo pomposo. Dançou valsa, usou vestido branco... Na sua imaginação, era uma noiva. Agora que passara pelo ritual do vestido branco, enfim seria mãe. E não precisou de muito. Desapareceu numa brincadeira de pique, bem no meio da festa. Mariluce encontrou o tio de uma amiga, um senhor levemente grisalho, bêbado, deitado num banheiro mais afastado. A casa de festas era grande, mas o baile estava concentrado no outro lado da construção. A debutante pulou em cima do bêbado, levantou o vestido e perdeu a virgindade ali mesmo.

O tiozão estava bêbado demais e aquilo só serviu para contar como primeira vez mesmo. A coisa não "fluiu". Mas Mariluce curtiu a possibilidade de ser mãe por alguns dias. Encantada, fez questão de voltar ao tal banheiro antes de ir embora da festa. Até mesmo procurou no chão pela tal da virgindade perdida.

Mariluce foi crescendo e ficando cada vez mais preocupada com a maternidade. Tentava e tentava, em vão. Trocava de parceiro, trocava de estratégia... Mas nada funcionava. Seu desespero era tanto, que acabou por espantar todos os namorados e candidatos a. E continuou sozinha.

Depois dos 25 anos, ficou ainda pior pra conseguir uma companhia masculina. Principalmente porque não conseguia deixar de falar - desde o primeiro encontro - da sua vontade de ser mãe. E também tornara-se mais seletiva: escolhia os homens de acordo com as características físicas, a fim de proporcionar a melhor combinação genética para a criança.

Os anos se passaram e Mariluce ainda era uma solteirona quando chegou aos trinta. A jovem balzaquiana lamentava profundamente por sua mão não ser capaz de fecundar seus óvulos. Era uma fantasia constante.

Certa vez, aos 33 anos, convenceu um amigo a tentar engravidá-la. Ele precisava de dinheiro e a oferta foi tentadora. Mariluce reuniu cerca de 16 simpatias em uma única noite. Tomou todas as providências possíveis, escolheu a data de acordo com a astrologia... O cara se entupiu de Viagra. Não porque Mariluce não fosse atraente. Pelo contrário, era lindíssima. O problema era a obsessão pela maternidade. Isso cortava o tesão de qualquer um.

Dois meses e quatro testes de gravidez depois, Mariluce resolveu iniciar tratamento para engravidar. Procurou o médico que fez a inseminação da Xuxa e deu um jeito de comprar esperma de um pagodeiro famoso que já tinha uns 7 filhos com sua esposa. "Um poço de fertilidade", suspirava.

Os anos passaram e nada. Até o próprio ginecologista tentou resolver o problema da mulher! Da forma tradicional, claro! A mulher pegava DST, mas não pegava barriga! E ela não desistia por nada!

A situação piorou quando se aproximou dos quarenta. A mulher passou a frequentar todos os tipos de orgia, fez filmes pornôs, pediu pra Deus, pro Diabo, pro Papai Noel... E nada.

Contrariando as expectativas, ela não enlouqueceu quando completou quarenta anos. Foi aos quarenta e um. Na verdade, nem dá pra chamar de "loucura". Mas o fato é que a mulher começou a achar que cada menstruação era uma criança. Foi assim que Mariluce começou a personificar cada sangramento. Ela curtia sua gravidez de 28 dias, delirava de emoção com as cólicas do parto, e paria aquele riacho de sangue, lindo, orgânico, real. Ela dava nomes para todos os filhos, conversava com eles e foi se apegando tanto a esse tipo de relação maternal, que até mesmo esqueceu dos bebês. E virou mãe de seus óvulos. Ela sofria quando cada um deles partia. Mas chorava de alegria quando percebia que esperava outro. E Mariluce finalmente foi feliz. Por 3 anos.

Aos 44 anos, Mariluce entrou na menopausa. Foi a maior tragédia na vida daquela mulher. Não restava mais nenhum filho, nem a possibilidade de ter outro, nem bebê real, nem netinho, nem nada. A realidade estapeou agressivamente seu rosto suado e salgado. A vida perdera o sentido. Não havia nada de errado com seu corpo. A criança simplesmente não veio. E não viria mais. Desde então, Mariluce sumiu. Ninguém sabe, ninguém viu.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Cacilda

Em vez de dormir, eu rodopiava pela cama. Não conseguia desligar. Ele provavelmente estava dormindo na caminha macia dele. E certamente nem imaginava que eu estava ali, deitada, insone, pensando nele. Isso mesmo! Ele tirou o meu sono! E não foi por nada de mais. Ele não fez nada. O que tomava meus pensamentos era a intensidade do que eu sinto por ele. E uma certa dose de medo. Existe uma forma de garantir que um relacionamento dê certo?

As olheiras estamparam a minha cara naquele dia. São poucas as pessoas capazes de notar esse tipo de sutileza. Até porque a maioria sequer olha pro nosso rosto. Ele me ligou pela manhã. Eu estava exausta. Acabei sendo meio fria com ele por causa do cansaço.

Ele não me falou, mas passou algumas horas intrigado com o meu comportamento. Imaginou que eu tivesse conhecido outro, cogitou um desentendimento no ambiente de trabalho e até mesmo uma TPM. Pensou se eu poderia ter sido infiel. Tal possibilidade lhe encheu de tristeza e angústia. Primeiro, porque seria uma prova de falta de amor. Segundo, porque seria o fim do relacionamento. Terceiro, porque seria a revelação de que eu não sou nada do que ele imagina.
E passou a tarde contemplativo.

No fim da tarde, um amigo ligou e convidou pra um boteco. Depois de ser xingado de "bichinha" e "viadinho" gratuitamente, ele concluiu que seus pensamentos estavam femininos demais e que não valia a pena se estressar por "uma simples TPM". E foi pro boteco. Ficou por lá mesmo. Ele não queria voltar a ter espaço para pensar sobre essas coisas de "viadinho".

Já estava ficando tarde e eu me sentia pior a cada minuto. "Ele esqueceu de mim". "Ele tá com outra". "Ele não me procurou até agora simplesmente porque não quer falar comigo".

Ele tinha medo de me ligar e eu não estar em casa.

Fiquei triste, carente. Resolvi recorrer ao passado: lembranças, fotos, agenda.

Agenda.

Liguei pra alguns deles. Alguns ex's, outros quase-ex's e outros quase-quase-ex's. No final, me sentia ainda pior.

Ele ligou quando chegou em casa. O telefone estava ocupado. Pra não pensar besteira, preferiu dormir logo.

Eu tive uma crise nervosa. Chorei a noite inteira. E ele, mais uma vez, nem imaginou.

No dia seguinte, culpado pelo porre, ele me ligou. Foi extremamente carinhoso. Saquei que havia alguma coisa errada. Com muita raiva no coração, saí pro primeiro bar que apareceu na minha frente e ia beijar o primeiro otário que me pagasse cerveja. O otário pagou. Mas eu não consegui. Foi horrível! Senti um nó no meu peito. Doeu de verdade.

Foi assim que eu percebi que o amo. Ou, pelo menos, amo o que eu imagino que ele seja. Se ele não for o cara legal que eu imagino, então eu simplesmente não o amo.

Ele ainda não sabe que me ama. É homem demais pra pensar sobre isso. Homem de verdade só percebe o quanto ama quando perde. E só perde por culpa exclusiva desse descaso todo.

É... Chegou a hora de terminar.